sábado, julho 19, 2025

Vidas em fragmentos - Quando o tempo parava para ouvir um disco

Houve um tempo em que, nas casas, ouvia-se o último disco de um cantor: um trabalho completo, com princípio, meio e fim. Muitos minutos de música que, na maioria das vezes, atuavam como um ator em cena — regidos por um texto, pela cenografia, pelo som e pelos demais atores. Cada faixa compunha uma parte de algo maior, e não o todo. Não era raro visitar um amigo só para ouvir o disco novo do Chico — ou, no mínimo, o compacto de alguma banda. Alguns álbuns continuam inteiros, analisados em sua totalidade, como verdadeiras obras que marcam o tempo.

Aos poucos, as músicas se dividiram entre as rádios. Os grandes sucessos tornaram-se solitários, órfãos das canções que davam sentido ao conjunto. O disco foi perdendo sua essência como unidade artística — uma representação do momento íntimo de um criador. Tudo ficou mais rápido, mais volátil, mais raso. Os livros afinaram, os jornais perderam páginas, conteúdo, escritores, profundidade. Os textões viraram tweets de 256 caracteres. O mundo perdeu a forma.

Busca-se amor platônico nas dedadas do Tinder. Amores ficaram mais inconstantes, fugazes, superficiais. As vidas ficaram vazias. O medo não nos deixa sair de casa, nos impede de nos conectar. Relações se tornaram fugazes. Ninguém entrega corpo e alma à vida. Espera-se pelo fim de semana, pela quarta à noite, pelo dia sem chuva, pelas férias, pela aposentadoria... pelo prêmio da loteria. E, quando se percebe, não se viveu. Não se amou. Não se sofreu.

Perde-se o sentido da vida porque se corre contra o tempo — sem fazer o devido uso dele.

O que sobra são fragmentos de uma vida inacabada como músicas perdidas e solitárias de um disco bom.


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